5G? Prefiro o meu Nokia de volta

Chegou a hora de trocar o seu celular, manda o anĂșncio na TV: o 5G estĂĄ chegando ao Rio. Sei que Ă© socialmente malvisto ficar de fora da onda, de qualquer onda, e se a publicidade diz que serei mais alegre e realizado com uma mega velocidade, sĂł pode estar certa. Eu, que ando procurando a felicidade em outros cantos, devo andar enganado.

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A publicidade e a tecnologia jamais estĂŁo erradas.

AlĂ©m da supervelocidade — como vivi antes dela, me pergunto —, ao que parece o 5G vai conectar as coisas. Todas as coisas. Elas vĂŁo conversar entre si e resolver seus problemas de forma objetiva. Boa sorte para as coisas, aproveitem. E nĂłs, aqueles que nĂŁo sĂŁo coisas e andam sem rumo, ainda Ă  procura de um sentido? Quem se importa? Os filmes, as mĂșsicas, as mensagens terĂŁo um download mais rĂĄpido, avisam os reclames. Comunicação instantĂąnea, exultam. Tento ficar satisfeito e radiante, apesar de saber que o problema dos dias atuais nĂŁo Ă© a falta de comunicação, mas o excesso. Viva! Viva! É o que exclamam por aĂ­.

No entanto, se o leitor — e a Cora e o Pedro Doria — me permitem a heresia, por mim eu voltava para o 3G, o 2G, ou para o G original. Se dĂĄ para falar com quem precisa e mandar mensagens para quem se quer, tĂĄ de bom tamanho. Na verdade, podĂ­amos atĂ© voltar para o Nokia tijolĂŁo, que devia ser œG e que mesmo assim resolvia. Sim, leitor, houve um tempo em que o celular era sĂł para situaçÔes urgentes, como incĂȘndios, pneus furados e o “cadĂȘ vocĂȘ?” indignado para a pessoa amada, na porta do cinema.

NĂŁo quero parecer um romĂąntico perdido e sem noção, desses que atrapalham as certezas alheias. NĂŁo, nada disso, acho que a tecnologia, especialmente a do dia a dia, Ă© uma maravilha: graças a ela ser preguiçoso e nĂŁo levantar do sofĂĄ por nada jĂĄ nĂŁo Ă© algo malvisto, por exemplo. Viva! Afinal somos a geração dos que sĂł sobem em escadas rolantes no shopping e depois vĂŁo para a academia se exercitar no simulador de... escadas. É nĂłis.

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NĂŁo devo reclamar: se estivesse escrevendo este texto Ă  mĂĄquina, teria muito mais trabalho e gastaria muito mais tempo, ainda que o tec-tec-tec das letras batendo no papel seja inspirador e a cena de arrancar o papel da mĂĄquina para conferir de perto o feito, memorĂĄvel.

Acabou, fazer o quĂȘ?

Na verdade, a minha queixa do telefone Ă© sua onipresença, agora que ele virou uma prĂłtese do corpo humano. O 5G sĂł vai aumentar o vĂ­cio. As vantagens? Fake news se espalhando mais rĂĄpido, vĂ­deos sem graça do WhatsApp circulando mais lĂ©pidos, tretas rolando frenĂ©ticas pelas redes sociais. Salve a ultravelocidade, canta o coro dos contentes. As minhas dĂșvidas sĂł desafinam.

Sei que muitos amigos ficarĂŁo indignados: como vocĂȘ pode esnobar uma Ferrari, que Ă© como se considera qualquer tecnologia nova, para ficar com um Fusca, que Ă© o que eu achava que dava pro gasto.

Talvez tenha perdido algo por aĂ­.

No entanto, jĂĄ percebi que vivo por ruas esburacadas e lido com engarrafamentos constantes. Uma Ferrari me seria inĂștil. Quando vejo esse auĂȘ todo com uma nova tecnologia, com a sua rapidez, com a publicidade e suas prĂłteses, penso mais no meu caminho que no fim.

Melhor pedir desculpas à publicidade, licença à tecnologia e deixar a hipervelocidade do 5G para mais tarde.

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