Anestesista acusado de estupro foi o responsável por sedação da vítima mesmo sendo estagiário

Preso acusado por estuprar mulheres durante cirurgias e investigado por armazenar pornografia infantil, o anestesista colombiano Andres Eduardo Oñate Carrillo foi o responsável pela sedação da paciente vítima de abuso sexual no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, administrado pela Universidade Federal do Rio (UFRJ). Segundo a investigação da Polícia Civil, o nome do médico consta no mapa de cirurgia geral daquele cinco de fevereiro de 2021, apesar de na época ele ser estagiário médico e não poder realizar procedimentos sem acompanhamento. A informação consta na decisão da juíza Daniela Barbosa Assumpção de Souza que aceitou a denúncia do Ministério Público contra Carrillo pelo estupro e transformou sua prisão em preventiva em 8 de fevereiro.

Na decisão, a juíza destaca que “o anestesista Andres Eduardo atuava como médico estagiário estrangeiro regulamentado”. Segundo ela, “apurou-se, ainda, que no dia dos fatos, conforme informado pela chefia do referido hospital, o acusado estava escalado no mapa da cirurgia geral, como o anestesista responsável pela cirurgia da paciente vítima nos autos”. Além disso, a paciente esteve na delegacia e confirmou que era ela a pessoa que aparece sendo abusada nas filmagens feitas pelo próprio colombiano. “Ela reconheceu a si mesma de maneira categórica como a paciente filmada no procedimento cirúrgico”, diz trecho da decisão obtida pelo EXTRA.

Com diploma de medicina da Colômbia, Andres Carrillo estava na UFRJ para fazer um curso de especialização, parecido como uma residência. Ele ingressou em fevereiro de 2018 e saiu poucos dias após a cirurgia pela qual é investigado. Como aluno e ainda sem ter o registro no CRM — obtido apenas em 2022 — ele não poderia praticar a medicina. Logo após a prisão do médico em 16 de janeiro, a direção do Hospital do Fundão afirmou que “não houve atuação não-supervisionada nas dependências”. Na saída de seu depoimento dois dias após a prisão de Andres Carrillo,Jorge Calasans, chefe do serviço de Anestesiologia do Clementino Fraga, afirmou que o médico colombiano era supervisionado “100% do tempo:

—Ele não ficou em momento nenhum sozinho. Agora, esse pessoal, em momentos furtivos, eles, que nem no outro caso que a gente já viu, que acaba maculando a profissão e a especialidade, são especialistas em fazer esse tipo de coisa. Agora a polícia está apurando da melhor forma possível. Nunca houve suspeita — disse na ocasião.

Procurada novamente sobre o nome de Carrillo estar como responsável pela anestesia da vítima, a direção do Clementino Fraga se limitou a dizer “colaborar com o caso que está sob sigilo judicial”. A defesa do médico também alegou não poder comentar por causa do sigilo. Atualmente seu registro médico está suspenso cauterlamente e ele responderá uma sindicância no Conselho Regional de Medicina do Rio e também responde por exercício ilegal da medicina.

As suspeitas sobre Andres Carrillo começaram após ele ser identificado por uma organização internacional americana não-governamental Centro Nacional para Crianças Desaparecidas e Exploradas (na sigla em inglês NCMEC). A rede tem parceria com o governo dos Estados Unidos e trabalha identificando suspeitas de exploração sexual infantil em diversas redes sociais como Facebook, Instagra e Whatsapp.

A NCMEC identificou então o armazenamento de 9.459 arquivos de imagens e vídeos que conteriam cernas de abuso sexual infantil armazenados na nuvem em contas de Carrillo. Nesse material foi encontrado um vídeo em que o anestesista praticaria o estupro de vulnerável ao esfregar seu pênis na boca de uma paciente. A organização internacional oficiou as autoridades brasileiras através de um “Report”. Após a notificação, a Polícia Civil identificou que a vítima das imagens era a mulher operada no dia 5 de fevereiro no Clementino Fraga.

O NCMEC ainda identificou imagens que teriam sido geradas pelo celular do anestesista, um dos indícios investigados de que o própio médico conversaria através de mensagens como crianças e adolescentes pelas redes sociais.

O anestesista colombiano Andres Eduardo Oñate Carrillo pediu para ser transferido para o Presídio Pedrolino Werling de Oliveira, conhecido como Bangu 8. Ele está preso desde o início do mês na Cadeia Joaquim Ferreira, também no Complexo de Gericinó. O pedido da defesa do médico é para que ele fique na unidade destinada a presos com nível superior. A petição da defesa a que o EXTRA teve acesso foi protocolada na última quinta-feira e cita que Carrillo teve seu diploma revalidado no Brasil.

"Ocorre que a prisão temporária foi convertida em prisão preventiva, efetivando-se a transferência do requerente para a Cadeia Pública Joaquim Ferreira, em pese este possuir nível superior (...) Frisa-se ainda que no diploma há o registro do Cremerj", escreve o advogado Mauro Fernandes da Silva.

Segundo Fernandes, é responsabilidade da Secretaria de Administração Penintenciária garantir a segurança do médico em qualquer unidade que ele esteja.

— Quando saiu de Benfica, ele foi encaminhado para a unidade prisional incompatível com o local onde deveria estar e o pedido é apenas a correção. Ir para Bangu 8 independe das acusações ou de sua nacionalidade, sendo a única condição a graduação em nível superior. Nem mesmo eventual suspensão do registro no CRM retira esse direito. Assim, ele atende a exigência e enquanto estiver preso deve estar lá — diz o adgovado.

Procurada, a Secretaria de Administração Penitenciária não informou se vai transferir o médico para Bangu 8.

A Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (Dcav) indiciou o médico colombiano Andres Eduardo Oñate Carrillo por mais dois crimes: estupro de vulnerável e exercício ilegal da profissão. Há ainda uma terceira investigação na delegaciapor abuso ocorrido no Hospital Estadual dos Lagos, em Saquarema, em 15 de dezembro de 2020.

Nesse inquérito, Andres Eduardo Oñate Carrillo é acusado de abusar de pacientes durante procedimentos no Hospital Estadual dos Lagos, em Saquarema, em 15 de dezembro de 2020. Segundo apurado, na época do crime, em 2020, ele não tinha registro no Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj).

Ele já havia sido indiciado por estupro de vulnerável no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, no Ilha do Fundão.

Andres ainda é investigado em mais um inquérito, que ainda está em andamento. Ele é suspeito de armazenar pornografia infantil por manter arquivadas mais de 20 mil imagens de abuso sexual envolvendo crianças e adolescentes. O delegado explica que ainda aguarda um parecer da perícia para concluir o caso e encaminhá-lo ao MP. Segundo o delegado responsável pelo caso, Luiz Henrique Marques, da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (Dcav), o inquérito será finalizado até o final de semana.

A análise do material de vídeo chamou atenção das autoridades pela gravidade e quantidade de arquivos, que incluíam bebês com menos de 1 ano.

O médico estuprou crianças?

A investigação contra Andres Carrillo começou em dezembro, após a Polícia Federal emitir um alerta depois de identificar armazenamento de pornografia infantil pelo colombiano. Durante seu depoimento, ele disse aos policiais que "não sabe precisar o motivo pelo qual nutriu dentro de si a compulsão em ver e armazenar pornografia infantojuvenil", mas que nunca abusou sexualmente de crianças.

"O declarante esclarece que nunca chegou a abusar sexualmente de crianças, mas satisfaz sua libido vendo imagens e vídeos tanto de meninos quanto meninas", diz a descrição do depoimento.

Investigando se há outras vítimas de estupro, a Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (Dcav) pediu para que quem suspeite que possa ser vítima de Carrillo que procure a polícia. Nesta quarta-feira, o pai de uma criança de 1 ano e 10 meses, que é paciente oncológico e fazia tratamento no Hospital Quinta D'Or, procurou o delegado responsável pelo caso, Luiz Henrique Marques. O pai suspeita que sua filha tenha sido, até agora, a terceira vítima do anestesista. O médico teria exigido ficar 30 minutos a sós com a criança para iniciar a sedação e entubação. Segundo o pai, Carrillo estava com o celular no bolso.

Em depoimento à polícia, na terça-feira, o pai da menina relatou que Carrillo estava acompanhado de uma enfermeira que teria saído da sala em seguida, para pegar equipamentos médicos, deixando o anestesista sozinho com a criança.

O colombiano aliciava crianças pela internet?

Uma das frentes de investigação no inquérito sobre o armazenamento de milhares de fotos e vídeos de pornografia infantil apura se ele aliciava os menores nas redes sociais. A Polícia Civil investiga se Andres Carrillo criou um perfil fake para se passar por criança e aliciar meninos e meninas na internet.

O médico gravou e estuprou outros pacientes sedados?

Ao prestar depoimento à Polícia Civil, Andres Carrillo contou que se aproveitava de momentos sozinho com as pacientes para cometer o estupro. O médico ainda relatou ter deletado arquivos de seu celular com medo de ser preso, mas não precisou a data que fez isso. A Dcav também vai pedir a perícia de todos os aparelhos do anestesista para recuperar provas que podem ter sido apagadas.

Por que Andres Carrillo atendia no Hospital estadual dos Lagos, um dos locais dos abusos?

A polícia encontrou ao menos dois vídeos em que Andres se reconhece nas imagens abusando sexualmente de pacientes. Uma das vítimas foi operada no Hospital Estadual dos Lagos Nossa Senhora de Nazareth, em Saquarema, em dezembro de 2020. Segundo a Secretaria estadual de Saúde, o médico deixou de atuar na unidade em setembro de 2021. Em nota, o órgão informou que “já solicitou à direção da unidade hospitalar todos os dados e prontuários do período em que o médico trabalhou como prestador de serviço e vai instaurar uma sindicância para apurar as devidas responsabilidades”.

No entanto, falta esclarecer o motivo de Carrillo ter atendido pacientes por quase um ano na unidade. Na época, o médico ainda não tinha registro no Conselho de Medicina e tampouco tinha sido aprovado no exame Revalida, que habilita seu diploma de medicina da Colômbia. A secretaria estadual de Saúde também não revelou a quantidade de procedimentos dos quais Carrillo participou.

Andres Carrillo exerceu a medicina irregularmente no Brasil?

O Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj) e a Polícia Civil investigam se o colombiano exerceu a medicina mesmo antes de conseguir ter seu diploma revalidado no Brasil. Carrillo chegou ao Brasil em 2017 para participar de um curso de especialização em anestesia na Universidade Federal do Rio (UFRJ), em moldes parecidos ao de residência médica, entre fevereiro de 2018 e fevereiro de 2021. No entanto, até janeiro de 2022, quando obteve seu registro de médico no Conselho Federal de Medicina, ele só podia atuar supervisionado.

A UFRJ nega que ele tenha realizado algum procedimento sem supervisão. Porém, em seu depoimento à polícia, o médico afirmou se aproveitar de momentos em que ficava sozinho com as pacientes para cometer os atos.

Por que Andres Carrillo atendia no Hospital estadual dos Lagos, um dos locais dos abusos?

A polícia encontrou ao menos dois vídeos em que Andres se reconhece nas imagens abusando sexualmente de pacientes. Uma das vítimas foi operada no Hospital Estadual dos Lagos Nossa Senhora de Nazareth, em Saquarema, em dezembro de 2020. Segundo a Secretaria estadual de Saúde, o médico deixou de atuar na unidade em setembro de 2021. Em nota, o órgão informou que “já solicitou à direção da unidade hospitalar todos os dados e prontuários do período em que o médico trabalhou como prestador de serviço e vai instaurar uma sindicância para apurar as devidas responsabilidades”.

No entanto, falta esclarecer o motivo de Carrillo ter atendido pacientes por quase um ano na unidade. Na época, o médico ainda não tinha registro no Conselho de Medicina e tampouco tinha sido aprovado no exame Revalida, que habilita seu diploma de medicina da Colombia. A secretaria estadual de Saúde também não revelou a quantidade de procedimentos dos quais Carrillo participou.

O médico trabalhou em quantos hospitais no Rio?

Ainda não se sabe quantas unidades da rede privada Andres Carrillo trabalhou no último ano. Além do Hospital Quinta D'Or, que abriu uma sindicância para apurar os procedimentos, não se sabe em quais hospitais privados ele participou de cirurgias.

Na rede pública, a única unidade que Andres Carrillo trabalhou como médico foi no Hospital Universitário Pedro Ernesto, administrado pela Uerj, entre maio e dezembro de 2022. No Hospital Universitário Clementino Fraga, da UFRJ, ele era somente um aluno e não poderia atender pacientes sozinhos. Por isso, seu nome no Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES) não aparece ligado ao hospital do Fundão.