Tática governista na CPI se complica após depoimento de Barra Torres

President of the National Health Surveillance Agency (ANVISA), Antonio Barra Torres walks before a meeting of the Parliamentary Inquiry Committee (CPI) to investigate government actions and management during the coronavirus disease (COVID-19) pandemic, at the Federal Senate in Brasilia, Brazil May 6, 2021. REUTERS/Adriano Machado
O presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, falou à CPI da Pandemia. Foto: Adriano Machado/Reuters

Entre o dissidente Luiz Henrique Mandetta e o aliado Antonio Barra Torres, um ponto de conexão acaba de ser detectado na CPI da Pandemia no Senado.

Mandetta havia revelado, na semana passada, a existência de um “aconselhamento paralelo” no entorno de Jair Bolsonaro para assuntos relacionados à pandemia. Disse também que, à sua revelia, o grupo chegou a elaborar um documento para alterar a bula da cloroquina e passar a indicá-la ao combate da covid-19.

Em seu depoimento à comissão, Barra Torres, presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), confirmou a elaboração desse decreto. Revelou ainda que quem o levou até ele foi a médica oncologista Nise Yamaguchi, uma entusiasta do medicamento que não tinha cargo oficial no governo.

Barra Torres disse ter reagido de maneira rude com a doutora diante da sugestão. E lembrou que só quem pode modificar uma bula é a agência do fabricante em seu país de origem. De quebra, ainda disse que a postura de Jair Bolsonaro durante a pandemia vai contra o que tem sido preconizado pela agência.

Conselheira informal do presidente, Yamaguchi chegou a ser cotada para assumir o Ministério da Saúde no lugar de Nelson Teich, que deixou o cargo, sabe-se agora, justamente por desentendimento com o presidente em relação à recomendação da cloroquina.

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Yamaguchi atuava no Hospital Albert Einstein e foi afastada em julho do ano passado. Em nota divulgada na época, a instituição israelita atribuiu a decisão a uma “analogia infeliz e infundada" feita pela doutora "entre o pânico provocado pela pandemia e a postura de vítimas do holocausto”.

A médica havia declarado que “poucos milhares de nazista conseguiram controlar aquela massa de rebanho de judeus famintos” após as vítimas serem diariamente submetidas a humilhações.

Ela sempre atribuiu o afastamento à sua defesa da cloroquina, medicamento descartado e não recomendado pelas principais autoridades sanitárias do planeta.

Com a declaração à CPI do presidente da Anvisa, a presença de Yamaguchi na comissão torna-se agora fundamental.

Segundo o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), ela mesmo havia se convidado para participar dos depoimentos. Sua presença havia sido solicitada também pelo senador oposicionista Ciro Nogueira (PP-PI). Era uma tática que se mostrou agora perigosa.

A declaração de Barra Torres sobre a pressão para mudança na bula e a revelação do total desconhecimento de como isso poderia ser feito complica a vida dos entusiastas da presença da “Doutora Cloroquina” na comissão. Ela agora vai ter que explicar a mando de quem o documento, que pode servir como prova da pressão indevida, foi formulado.

Com aliados assim, quem precisa de oposição?