"#FicaGabriel": por que queremos manter homens abusivos no BBB?
Mesmo após bronca de Tadeu por agressões a Bruna, modelo tem torcida forte por segunda chance no programa. Perdoamos rápido demais?
Antes mesmo que o paredão desta semana fosse formado no Big Brother Brasil 23, a hashtag #FicaGabriel já estava entre as mais comentadas no Twitter. Os apoiadores dele sabiam que o modelo Gabriel Tavares corria risco de ir à berlinda, especialmente após cultivar desafetos dentro do programa, como Fred Nicácio, Larissa e Domitila, levar uma bronca do apresentador Tadeu Schmidt por atitudes abusivas em relação a seu affair, a atriz Bruna Griphao.
De fato, no programa de domingo (29), a previsão se confirmou e ele foi emparedado ao lado de Domitila e Cezar, e a tag pedindo sua permanência na casa só subiu.
Mas por que, mesmo depois de uma discussão pública sobre machismo e abuso, Gabriel ainda tem uma torcida forte no reality – inclusive de mulheres?
Eu sou #FicaGabriel pq cansei desse cancelamento tosco que vcs causam em todo BBB, vcs pedem um mundo melhor mas não dão a chance de ngm evoluir. Não quero plantas na final do BBB, e quero ver a cara do insuportável do Fred Nicácio com a volta do Gabriel #BBB23 #ForaDomitila pic.twitter.com/QroYn0X1lD
— ♡ sour switchblade ♡ (@rottendollie) January 30, 2023
Em geral, tratamos os homens – principalmente os jovens adultos, como Gabriel, que tem 24 anos – como meninos, que “não sabem o que estão fazendo” e merecem uma segunda chance. Enquanto meninas, mesmo adolescentes, são tratadas como responsáveis por suas atitudes desde muito novas.
Não é por acaso que meninas são ensinadas a cumprir tarefas domésticas desde muito cedo enquanto os meninos no máximo secam a louça; ou que meninas que engravidam na adolescência muitas vezes têm pouco ou nenhum apoio porque precisam “arcar com as consequências”, enquanto homens deixam de assumir a paternidade e tudo certo. Vem dessa ideia de amadurecimento tardio um sentimento coletivo de condescendência por Gabriel.
“Ah o Gabriel tá querendo mudar”
Ele tá no BBB mona, não na clínica de reabilitação.— Fany Ramos 🦖 (@Fanyramosof) January 30, 2023
Basta voltar dois anos no programa para lembrar que, quando Karol Conká teve atitudes abusivas com Lucas Penteado e outros confinados, foi massacrada pelo público: saiu com o maior índice de rejeição da história do programa, perdeu contratos e recebeu centenas de ataques nas redes sociais, que escalaram inclusive para ameaças de morte.
Vocês lembram da eliminação da Karol Conká no BBB21? Ela saiu com 99,17% de rejeição 😱😱😱 pic.twitter.com/bVspZc1lzS
— Plantão Cinema🚨🍿 (@plantaocinema) December 15, 2022
Nada disso é razoável – nem com Karol, nem com Gabriel. Mas fato é que os dois participantes, uma mulher negra e um homem branco, encararam tratamentos em diferentes frente a atitudes agressivas que demonstraram no programa.
Karol Conká: mulher preta com atitudes lastimáveis no #BBB
Resultado: 99.17% de rejeição
Gabriel Fop: homem branco com atitudes lastimáveis no #BBB23
Resultado: não vamos eliminar, ele movimenta o jogo (assediando e acabando com uma mulher).
Por que ainda somos assim, Brasil? pic.twitter.com/n7U3uTROv8— RT (@renan_lt) January 30, 2023
Desde que ouviu o “toque” de Tadeu, há pouco mais de uma semana, Gabriel pediu perdão a Bruna, à família dela e à sua família, chorou, disse que estava passando pela pior semana de sua vida e prometeu mudar. Mas isso é suficiente para perdoá-lo – ou, ainda, premiá-lo – por ameaçar dar cotoveladas na boca da namorada? Ou por empurrá-la para tentar evitar que ela falasse?
bom, aqui eu seria expulsa #bbb23 pic.twitter.com/k7VVIEliEH
— BBBabi (@babi) January 22, 2023
Quando o assunto é violência de gênero e relacionamentos abusivos, nossa tendência é naturalizar o comportamento agressivo do homem porque, de forma coletiva, estamos acostumadas a ele – prova disso é que, no Brasil, oito mulheres são agredidas por minuto, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
“A cultura brasileira é extremamente machista e, embora as discussões sobre relações tóxicas sejam cada vez mais abertas e recorrentes, ainda somos um país com índices alarmantes de violência doméstica”, explica a psicóloga Lais Sellmer, ao Yahoo, ao comentar a relação entre Gabriel e Bruna. “É algo que a gente vê repetidas vezes dentro de casa, entre amigos, na televisão, e que, por isso, pode se tornar naturalizado no nosso inconsciente”.
A história se repete
Vale lembrar que essa não é a primeira vez que o público do BBB escolhe ficar do lado de um homem com atitudes claramente machistas e abusivas.
O caso mais emblemático é o de Marcos Harter, na edição 17. O relacionamento do médico com a então estudante Emilly Araújo virou caso de polícia quando ele foi expulso, na última semana do programa, após a Delegacia Especial de Atendimento à Mulher instaurar um inquérito para apurar as agressões físicas.
O Tadeu interferiu hoje justamente pra situação não chegar nesse nível novamente. Quem assistiu lembra que começou justamente com brincadeiras e frases soltas como as do Gabriel.#BBB23dá recado ao casal Bruna Griphao e Gabriel no BBB 23: ‘Um alerta antes que seja tarde’ pic.twitter.com/mZV3wdxTxt
— Ricardo (@RobivanC) January 23, 2023
Harter deixou o programa, mas como um dos favoritos ao prêmio. Meses depois, ele foi escalado para o elenco de "A Fazenda" e – pasmem – ficou em segundo lugar.
Mesmo fora do reality, não são poucas histórias que conhecemos de famosos que agrediram verbal, psicológica ou fisicamente suas namoradas e foram perdoados, mantendo a carreira intacta depois disso.
Chris Brown, Johnny Depp e Cristiano Ronaldo são só os primeiros nomes que me vêm à mente, mas tenho certeza que você consegue pensar em outros sem muito esforço.