Sobre o que escrever?

Encontrar o tema de uma redação não deixa aflitos apenas novatos da caneta. Também preocupa escritores tarimbados e até aqueles de alto fÎlego verbal e longas påginas.
Afinal o mundo é fåbrica e vitrine de milhÔes de assuntos. A unha encravada do seu avÎ, a aliança entre Marina Silva e Eduardo Campos, o aquecimento global, a sua vizinha louca, o bule de porcelana, a panela de barro, a morte de refugiados.
Resumo: assunto nunca falta. Todos eles, da unha encravada ao aquecimento global, podem render bons ou maus textos. Sempre terĂĄ a ver com o recorte e o bordado. Isto Ă©, dependerĂĄ do tratamento dado e da perĂcia do autor.
Para nĂłs, os cronistas, encontrar o tema Ă© a etapa mais sensĂvel do trabalho. Pois cronistas tĂȘm liberdade ilimitada de escrita. Somos generalistas e, Ă s vezes, campeĂ”es dos dois metros rasos. Em contrapartida, nos Ă© vetado ficar sem assunto.
Onde o cronista busca seus temas? Em qualquer lugar. Com qualquer pessoa. Podem inspirar: uma cena banal em um ponto de Înibus, uma metade de frase dita pelo garçom, uma fotografia em preto e branco, um cheiro, um som.
TambĂ©m o cronista pode buscar a prosa dentro de si mesmo. Nas paixĂ”es vividas e nĂŁo vividas. Nas dĂvidas e nas contas pagas. Nas alegrias graves e nas dores agudas. Ou nos seus encantos e sem-gracices pessoais.
O assunto da crĂŽnica de hoje pincei, no domingo passado, ao ler num jornal o depoimento da filha do SĂ©rgio Porto (1923-1968), mais conhecido como Stanislaw Ponte Preta. Ele foi cronista dos graĂșdos e tinha uma verve carioca, irreverente, matadora. Faz falta!
Ăngela Porto, a filha, nos conta como o pai encontrava os assuntos: "(...) Papai se sentava na areia da praia, lia freneticamente os jornais e recortava com uma tesoura as notĂcias que usaria mais tarde como material para suas crĂŽnicas."
Imaginei então se o Stanislaw Ponte Preta tivesse conhecido o Facebook - esse caleidoscópio feito de opiniÔes, estados d'alma, indignaçÔes, palavras de amor, frases de ódio. Acho que ele ficaria seguro e feliz da silva em ser um cronista.
Imagem: Régine Ferrandis, Paris.