SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Caxemira vive momentos de tensão desde que o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, revogou a autonomia da região na segunda-feira (5).
Logo antes do anúncio, as forças de segurança indianas impuseram um toque de recolher e prenderam líderes políticos locais. Além disso, houve um bloqueio das telecomunicações, alimentando a desinformação sobre o que acontece na região.
A medida gerou temores de perseguição contra a população muçulmana da Caxemira e provocou o agravamento das tensões nas relações com o vizinho Paquistão, que disputa partes do território com a Índia. Protestos foram convocados para esta sexta-feira (9).
Na segunda-feira, Modi anunciou a revogação do artigo 370 da Constituição indiana, que garantia aos residentes de Jammu e Caxemira (nome oficial da porção indiana da Caxemira) um certo grau de autonomia sobre os afazeres da região exceto nas áreas de Defesa, Política Externa e Finanças.
O dispositivo era uma exigência dos líderes da Caxemira para se juntar à Índia em 1947, durante a separação da antiga colônia britânica entre a Índia, de maioria hindu, e o Paquistão, de população muçulmana.
A Caxemira tem maioria muçulmana, mas os marajás hindus que governavam o local declararam lealdade à Índia durante a partilha a ONU recomendou que a população decidisse o futuro da região em um plebiscito, mas as autoridades da Índia e do Paquistão jamais permitiram que a consulta ocorresse.
Em pronunciamento transmitido pela TV na quinta-feira (8), Modi justificou sua decisão dizendo que o artigo 370 dificultava o combate ao terrorismo na Caxemira e que sua revogação daria início a uma nova era de prosperidade na região. Grupos de oposição afirmam que a medida é inconstitucional e prometem questioná-la na Suprema Corte.
A decisão do governo Modi gerou uma reação imediata do Paquistão, que decidiu, em retaliação, cortar laços com a Índia. O país se apresenta como defensor da população muçulmana na porção indiana da Caxemira.
A região já foi palco de duas guerras entre os países, além de incontáveis escaramuças a mais recente conflagração ocorreu em fevereiro, após um atentado de grupos separatistas contra forças indianas.
Nos últimos dias, o governo do Paquistão expulsou o embaixador indiano e suspendeu o comércio bilateral com o vizinho, incluindo um boicote a filmes produzidos na Índia. A tensão gera temores de uma escalada militar entre os dois países, embora uma nova guerra seja improvável tanto o Paquistão quanto a Índia têm armas nucleares.
O primeiro-ministro paquistanês, Imran Khan, afirmou na terça-feira (6) que a revogação da autonomia da Caxemira pode incentivar novos atentados. Khan também prometeu acionar as instituições internacionais Levaremos o caso da Caxemira à ONU e notificaremos a comunidade internacional sobre o tratamento dispensado às minorias na Índia.
Os residentes muçulmanos da Caxemira temem que a revogação da autonomia dê lugar a políticas de controle populacional além de aumentar o poder do governo de Nova Délhi sobre o território, a decisão de Modi abre espaço para que pessoas de fora da Caxemira adquiram terras ali. Há receio quanto à hinduização do território.
O recrudescimento do controle sobre a Caxemira era uma bandeira dos nacionalistas hindus do BJP (sigla em hindi para Partido do Povo Indiano), agremiação do premiê Modi. O partido, que conquistou a maioria do Parlamento nas eleições gerais de maio, defende a reforma das instituições de poder da Índia conforme os preceitos do hinduísmo, em detrimento da laicidade e da pluralidade religiosa do país.
Hoje é o dia mais sombrio para a democracia indiana, disse em uma rede social na segunda-feira Mahbooba Mufti, ex-governadora de Jammu e Caxemira que havia sido colocada em prisão domiciliar na véspera. A intenção do governo é clara e sinistra. Querem transformar a demografia do único Estado de maioria muçulmana na Índia, desapoderando os muçulmanos até que virem cidadãos de segunda classe em seu próprio Estado.