Acabou a corrupção no Brasil. Alguém avisa o Queiroz?
A remuneração bruta mensal mais baixa entre os ministros de Jair Bolsonaro é de R$ 30.934,70. Era o valor que pingava religiosamente nas contas de Ricardo Vélez Rodríguez e Abraham Weintraub, os dois primeiros ministros da Educação do novo dia do novo tempo que começou.
Juntos, eles passaram um ano e meio em Brasília ao custo aproximado de R$ 500 mil, o equivalente a 14 cheques que algum assessor metido em confusões eventualmente possa depositar por engano nas contas de nossos cônjuges.
Ganha um visto especial para entrar nos EUA e fugir da cadeia quem lembrar o que, além de bravatas, Vélez e Weintraub fizeram pela educação brasileira.
Como lembra insistentemente o jornalista Elio Gaspari em suas colunas, foi na gestão Weintraub que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) anunciou, em agosto de 2019, que realizaria um pregão eletrônico para a compra de 1,3 milhão de computadores, notebooks e laptops ao custo de R$ 3 bilhões. A compra só foi cancelada porque a Controladoria-Geral da União apontou “inconsistências” no edital. Por sorte, alguém da CGU achou de bom tom perguntar o que fariam os 255 alunos de uma escola do interior de Minas Gerais com 30 mil laptops. E por que 355 escolas receberiam mais de um laptop por aluno.
Até agora ninguém se responsabilizou pelo jabuti.
Há quase dois anos o público banca os salários de um ministro do Meio Ambiente que passa mais tempo nas redes ou em carros de boi do que dobrando a barra das calças para impedir os estragos das queimadas na Amazônia e no Pantanal. E uma ministra dos Direitos Humanos que atua em horário comercial como crítica de cinema e de moda. Banca também um intocável ministro do Turismo investigado em um esquema de candidaturas laranjas.
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Certamente não saiu de graça a propaganda com alegorias nazistas protagonizada por um agora ex-secretário de Cultura. Nem a estadia em Brasília de uma atriz global cuja contribuição maior ao setor foi minimizar as mortes por coronavírus e por tortura ao longo da História.
Desde que assumiu, Bolsonaro tem ampliado o bolo da verba publicitária a emissoras claramente domesticadas em relação à cobertura do Executivo. Sócio de uma empresa de comunicação com contrato com algumas dessas emissoras, o chefe da Secretaria de Comunicação chegou a ser alvo de um inquérito da Polícia Federal para apurar possíveis crimes de corrupção passiva, peculato e advocacia administrativa.
No governo, ninguém sabe ninguém viu como verbas públicas para publicidade irrigaram sites de fake news, jogo do bicho e canais de YouTube engajados em bajular o presidente. Só os canais de um blogueiro que relaciona masturbação a mortandade de neurônios recebeu 1,5 mil anúncios.
Em sua saída da Secretaria do Governo, o general Carlos Alberto Santos Cruz manifestou indisposição justamente a ceder verbas publicitários para blogs aliados do bolsonarismo.
No auge da pandemia, Jair Bolsonaro quis mudar o comando da PF alegando perseguição a seus filhos e aliados. Sergio Moro, então superministro da Justiça, não concordou e deixou o posto acusando o presidente de interferência indevida na corporação. O caso está na Justiça, onde o presidente pede agora para depor por escrito.
Ainda na pandemia, Bolsonaro usou dinheiro público para comprar, fabricar e divulgar os benefícios milagrosos de um medicamento de eficácia descartada enquanto fritava seu ministro da Saúde ou mantinha no posto um titular que admite agora não saber nem o que era o SUS. Os mortos já passam de 150 mil.
Eleito com discurso agressivo contra a corrupção, Jair Bolsonaro declarou na quarta-feira 7 que acabou com a Lava Jato porque os serviços prestados pelos procuradores da força-tarefa não são mais necessários, já que em seu governo não existe mais corrupção.
Nem em Brasília nem em Atibaia, onde um ex-assessor responsável por distribuir verbas de funcionários dos gabinetes de sua família foi encontrado pela polícia na casa de um advogado do clã. O mesmo advogado recebeu recentemente R$ 10 milhões de um frigorífico em uma causa que nem as melhores bancas conseguem explicar.
Explicar para quê?
No novo Brasil, corrupção é a erva que brota apenas na grama vermelha do vizinho. Na grama e nos ervanários pintados de verde e amarelo brotam apenas patriotismo ou enriquecimento por mérito próprio. Quem discorda é comunista.