Escalada golpista assusta moderados e trava crescimento de Bolsonaro em pesquisa
A interrupção da tendência de crescimento da candidatura de Jair Bolsonaro (PL) à reeleição, observada desde fevereiro, coincide com a repercussão da (nova) escalada do presidente contra o Supremo Tribunal Federal, o Tribunal Superior Eleitoral e as urnas eletrônicas. A postura, que transformou em troféu o indulto a um deputado violento e perigoso como Daniel Silveira (PTB-RJ) e envolveu novas ameaças à realização do pleito em outubro, pode ter animado as bases bolsonaristas, mas assustou e provocou o afastamento, como previsto, dos eleitores moderados que ensaiavam o embarque na candidatura do ex-capitão.
A percepção foi mensurada na pesquisa Genial/Quaest divulgada no início da semana. O levantamento mostrou que 45% dos eleitores reprovaram o perdão de Bolsonaro a Silveira, enquanto 30% disseram apoiar a decisão.
Entre eleitores do ex-presidente Lula (PT) a rejeição ao indulto chegou a 61% e, entre quem não quer nem um nem outro no comando do país a partir de 2023, o índice atingiu 54%.
Em nota distribuída à imprensa, o diretor da Quaest, Felipe Nunes, lembrou que os eleitores de Bolsonaro e Lula já estão definidos, e que quem vai decidir a eleição é exatamente essa faixa “nem-um-nem-outro”.
Do total, 12% disseram que o perdão diminuiu as chances de votar no atual presidente.
“O afastamento dos moderados explica por que caiu o número de eleitores que votaram em Bolsonaro em 2018 que defendem a reeleição. Eram 63% em abril e são 58% hoje. A pesquisa mostra que 18% dos eleitores de Bolsonaro nas eleições passadas pretendem votar em Lula”, explicou Nunes no comunicado.
A pesquisa mostrou um campo minado pelo próprio presidente ao insistir também no ataque às urnas eletrônicas. Isso porque, para 75% dos eleitores, o atual sistema de votação é confiável – 68% diziam o mesmo em setembro de 2021, quando Bolsonaro subiu ao palanque com seu figurino golpista no 7 de Setembro.
Quatro em cada dez eleitores dizem hoje que o sistema é “muito confiável”; para 35%, ela é mais ou menos confiável. Já o número dos que dizem desconfiar da urna eletrônica caiu 7% no período (de 29% para 22%). Tudo isso apesar das contestações publicizadas pelo governo e parte das Forças Armadas em relação à segurança do pleito —todas respondidas pelos técnicos do tribunal.
Um dado curioso da pesquisa é que a reprovação de Bolsonaro, de 46% na população geral, oscila conforme o meio em que o entrevistado diz acompanhar as notícias sobre política. Para quem assiste TV e ou costuma ler blogs ou portais de notícia, Bolsonaro é rejeitado por 52% e 48%, respectivamente; já para quem lê apenas redes sociais, a principal trincheira do bolsonarismo e das Fake News, o índice cai para 37%.
No Nordeste a reprovação do governo é de 51%, número mais alto entre as macrorregiões, mas que já foi de 60% em novembro do ano passado –antes, portanto, do pagamento do Auxílio Brasil de R$ 400.
Como os “candidatos a candidatos a terceira” somam apenas migalhas na pesquisa, Lula hoje, beneficiado pela escalada golpista do rival, está na margem de erro para vencer a eleição no primeiro turno.
Como os dois principais postulantes já são conhecidos do eleitor, e a maioria dos votos (63%) está cristalizada –esse índice de pessoas com a escolha definida só foi atingido em setembro da eleição de 2018 –, a margem do bolsonarismo para reverter a desvantagem ficou menor e mais dependente do chamado "fato novo". É bom não duvidar.
Fato é que o entorno do presidente esperava que, a essa altura, o candidato à reeleição já tivesse reduzido de maneira mais acelerada a vantagem do adversário. Havia previsões, inclusive, de que já poderia estar à frente das pesquisas. Foi para isso que Paulo Guedes e companhia abriram a carteira.
Faltou combinar com Bolsonaro, que quanto mais assume a postura golpista, mais afasta possíveis eleitores. Para ele, o quadro fica ainda mais complicado à medida que a situação econômica, afetada pela alta da inflação, se deteriora. Não por acaso, 50% dos entrevistados dizem que o principal problema do país é a economia, uma situação que só piorou na comparação com o último ano na opinião de 62%.
Diante do cenário, resta a Bolsonaro uma escolha de Sophia: interromper os ataques, fingir alguma normalidade e correr o risco de perder no jogo limpo ou insistir em minar o campo e terminar a campanha com menos votos, menos força e menos apoio para sequer começar a virar a partida no tapetão.