'O Império Serrano não foi rebaixado, foi esculachado': queda da escola causa indignação
A primeira escola a desfilar é sempre a maior candidata ao rebaixamento, pois vem da Série Ouro, a segunda divisão do samba. Escolado no efeito iô-iô, ou seja, na descida no ano imediatamente subsequente à subida, ou no máximo dois anos depois, o Império Serrano fez o dever de casa: contratou um carnavalesco com anos de experiência em grandes escolas (Alex de Souza, ex-Salgueiro e ex-Vila Isabel), um dos melhores puxadores, Ito Melodia, e escolheu para enredo uma figura unânime no mundo do samba, o imperiano Arlindo Cruz. Após o desfile, a escola comemorou a passagem sem incidentes pela Avenida e agradeceu pelos aplausos emocionados do público.
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Resultado da apuração: Veja como ficaram as notas do Grupo Especial
De nada serviu: terminada a apuração, a Mocidade, que chegou a estar empatada com o Império em alguns momentos, garantiu a décima primeira e penúltima colocação com um ponto inteiro de folga, e a verde e branco estava de volta ao grupo de acesso.
— A panela continua mandando no carnaval — vociferou Babi, mulher de Arlindo e ex-porta-bandeira. — Esse estigma de que a primeira escola tem que ser rebaixada precisa acabar, é uma covardia. Um enredo bem explicado, que emocionou 99% do povo da Avenida e não disse nada aos jurados. É lamentável!
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Uma das Quatro Grandes dos antigos carnavais, ao lado de Mangueira, Salgueiro e Portela, o Império Serrano foi rebaixado pela primeira vez em 1978, com o enredo “Oscarito, carnaval e samba — Uma chanchada no asfalto”, retornando ao Grupo 1, como se chamava o Grupo Especial na época, logo depois. A escola só seria rebaixada novamente em 1991, quando começou o efeito iô-iô que dura até hoje. Nos últimos 32 anos, o Reizinho de Madureira se manteve entre as duas divisões, conseguindo, no máximo, uma sequência de sete carnavais na elite, entre 2001 e 2007. A partir de 2008, amargou oito anos no segundo grupo. Neste século, a escola desfilou 11 vezes no Grupo Especial e outras 11 na Série Ouro.
— O Império Serrano fez um desfile impecável — afirma a escritora e pesquisadora Rachel Valença, autora do livro “Serra, Serrinha, Serrano: o Império do samba” (Record), integrante da Velha Guarda e jurada do Estandarte de Ouro (mas que não julgou o Grupo Especial). — Não houve buracos nem quebra de carros, só animação ao som de um samba e de uma bateria excelentes. O trabalho do carnavalesco Alex de Souza foi maravilhoso, e a escola desfilou muito motivada. O Império Serrano não foi rebaixado, foi esculachado. As notas baixas, inferiores às de coirmãs que tiveram problemas graves, nos dizem bem claramente alguma coisa sobre a lisura do julgamento. Nele, acredita quem quiser: eu não mais, e há muito tempo.
Das 36 notas atribuídas pelos jurados à escola, apenas cinco foram 10, três em bateria — comandada pelo mestre Vitinho, vencedor do Estandarte de Ouro de Revelação — e duas em samba-enredo. Na enxurrada de avaliações imperfeitas, chamou a atenção um 9,5, grau que não era conferido desde 2014, da jurada Regina Oliva, em Fantasia.
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— Nada justifica as notas recebidas pelo Império — critica o violonista e arranjador Luís Filipe de Lima, também membro do júri do Estandarte. — Podemos considerar que não foi brilhante; aliás, as três escolas que falavam de samba, Império, Portela e Grande Rio, não vieram com sambas inspirados. Mas existe um preconceito velado dos jurados contra a escola que vem do acesso. Acho que a saída é um sorteio com todas as escolas para decidir a ordem do desfile.
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O sentimento geral, no entanto, é o de que o show tem que continuar, como diz o samba do próprio Arlindo.
— Quero agradecer à escola pelo emocionante desfile de domingo — diz o compositor João Bosco, torcedor da escola. — O asfalto será sempre a passarela do Império Serrano. Vamos em frente pois amanhã é um novo dia.
O futuro do Império não deve ter Sandro Avelar, que, nas redes sociais, anunciou sua saída da presidência da escola: “Estarei na torcida por dias melhores”, escreveu. A eleição acontece em maio.
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