O que levou o Uruguai a buscar um acordo com a China. Entenda
Em setembro de 2021, os sĂłcios do Mercosul foram surpreendidos com a notĂcia de que o Uruguai pretendia conversar com a China sobre um acordo de livre comĂ©rcio. O anĂșncio ia na contramĂŁo de princĂpios atĂ© entĂŁo considerados sagrados dentro do bloco: nenhum membro poderia negociar um tratado do gĂȘnero em separado dos demais; e um acerto prevendo a redução de alĂquotas de importação acabaria com a Tarifa Externa Comum (TEC), usada no intercĂąmbio com terceiros paĂses.
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Nesta quarta-feira, o presidente uruguaio, Luis Alberto Lacalle Pou, admitiu divergĂȘncias com o Brasil sobre as negociaçÔes de seu paĂs em torno de um acordo de livre-comĂ©rcio com a China e propĂŽs que o governo brasileiro negocie paralelamente com o gigante asiĂĄtico e, posteriormente, os dois paĂses tentem alinhar as prioridades nesta relação.
- Não brigamos, mas simplesmente marcamos pontos de diferenças para melhorar o Mercosul - pontuou Lacalle Pou, após encontro com Lula em Montevidéu.
Mais autonomia
O Uruguai sempre quis ter maior autonomia para negociar com outros parceiros internacionais, sob o argumento de que nĂŁo pode esperar, principalmente, por Brasil e Argentina, que relutam em abrir seus mercados, devido Ă pressĂŁo de seus respectivos setores industriais. JĂĄ tentou algo parecido com os Estados Unidos, nos anos 1990, mas acabou desistindo.
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Desta vez, o governo uruguaio reforça que o paĂs precisa caminhar sozinho, sem que isso signifique a saĂda do Mercosul, pois sua economia tem um peso bem menor do que as do Brasil e da Argentina. E destaca que, quando surgem oportunidades para que o Uruguai aumente suas exportaçÔes de carnes e lĂĄcteos para outros mercados, algo sempre dĂĄ errado, nĂŁo por culpa de MontevidĂ©u.
Um exemplo clåssico é o acordo entre Mercosul e União Europeia. Devido a questÔes ambientais que afetam o Brasil, o que foi assinado em 2021 ainda não foi aprovado na Europa e a entrada em vigor do tratado, a curto ou médio prazo, é considerada improvåvel.
â O Uruguai Ă© um paĂs que nĂŁo conta com a estrutura industrial que a Argentina e o Brasil tĂȘm. O paĂs quer uma maior liberalização comercial, porque se sente prejudicado com as altas alĂquotas da TEC. Os uruguaios querem exportar mais, mas tambĂ©m precisam aumentar e diversificar suas importaçÔes â afirmou o consultor internacional Welber Barral, ex-secretĂĄrio de ComĂ©rcio Exterior.
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Certificado de origem
Segundo Barral, o Uruguai reclama que deveria ser um paĂs aberto para o mundo inteiro e que suas importaçÔes poderiam ser mais baratas, se as tarifas de importação do bloco sul-americanos nĂŁo fossem tĂŁo elevadas. O consultor alerta, porĂ©m, que existe risco nĂŁo apenas de o acordo perfurar a TEC mortalmente, mas tambĂ©m gerar problemas de certificado de origem.
â Como saber se determinado produto com maior valor agregado importado da Argentina nĂŁo tem componentes chineses? â perguntou Barral.
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O presidente da Associação de ComĂ©rcio Exterior do Brasil (AEB), JosĂ© Augusto de Castro, avalia que o Uruguai sabe que serĂĄ âengolidoâ pela China se firmar esse acordo, mas busca uma saĂda honrosa, com compensaçÔes oferecidas pelo Brasil. Para Castro, a decisĂŁo de negociar com os chineses foi polĂtica, e nĂŁo econĂŽmica.
â O Uruguai seria anexado pela China na porta do Mercosul e nĂŁo conseguiria aumentar suas exportaçÔes como pretende â afirmou o presidente da AEB.
No ano passado, o Uruguai teve um déficit comercial de US$ 1, 2 bilhão no intercùmbio com o Brasil. No comércio com todo o Mercosul, houve um superåvit de US$ 3,2 bilhÔes do lado brasileiro.