Até o fim de 2019, a pobreza atingirá 191 milhões de pessoas (30,8% da população) na América Latina, dos quais 72 milhões (11,5%) estarão em situação extrema. O incremento, em relação ao ano anterior, é de 6 milhões de pessoas.
A projeção foi divulgada na quinta-feira, dia 28, pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) da ONU.
Entre 2014 e 2018, o órgão apontou aumento de 2,3 pontos percentuais da pobreza na média regional. O número foi puxado por Brasil e Venezuela, mas não só.
A porcentagem de pessoas pobres na América do Sul havia caído entre 2014 e 2017, e voltou a apresentar aumentou recententemente, com a piora do quadro econômico na Argentina em 2018. Na América Central e no México, em compensação, o índice relativo à pobreza caiu de 45% em 2014 para 42% em 2018.
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A redução da pobreza, segundo o Cepal, passa pelo enfrentamento da desigualdade, com políticas redistributivas e fiscais ativas, e não apenas crescimento econômico.
Entre 2002 e 2017, a participação dos estratos de baixa renda no total da população na região diminuiu de 70,9% para 55,9%.
Nos estratos de renda média, a pressão é alta: mais da metade da população não havia concluído o ensino médio em 2017; 36,6% possuíam ocupações com alto risco de informalidade e precariedade, e apenas a metade das pessoas economicamente ativas contribuía para algum sistema de previdência.
A comissão alerta para o déficits de inclusão social e do trabalho e um alto grau de vulnerabilidade ao retorno à pobreza nas classes médias diante das mudanças provocadas pelo desemprego e a queda na renda.
Enquanto entre 2002 e 2014 o índice de Gini na região diminuiu 1% ao ano, entre 2014 e 2018 a queda foi de 0,6% ao ano.
No Brasil, em 2014, a participação do 1% mais rico no total da renda do país alcançava 9,1%, de acordo com as pesquisas em domicílios. O número sobe agora para 27,5% quando se leva em conta as informações fiscais.
No Chile, a participação do 1% mais rico na renda total subiu para 22,6%. No Uruguai a proporção é de 14%.
A desigualdade aumentou também na Argentina e na Colômbia.
A América do Sul é hoje palco de intensas manifestações populares. Onde houve eleições houve mudança de comando, como na Argentina, no Uruguai ou mesmo no Brasil em 2018. (Na Bolívia, a tentativa de Evo Morales de obter um novo mandato, apontada com fraudulenta por observadores internacionais, resultou em um golpe de Estado, novas manifestações, repressão e impasse político).
Onde não houve eleições a insatisfação tomou as ruas, caso do Chile, onde o presidente Sebastian Piñera foi obrigado a recuar e propor uma série de reformas, no Equador, onde a sede de governo precisou mudar de cidade temporariamente, e, mais recentemente, na Colômbia.
Os números do Cepal podem ajudar a entender a onda de revolta que tomou os países do Sul em um momento em que a região observa como coadjuvante a disputa econômica protagonizada por grandes corporações do Vale do Silício e as potências asiáticas pelas novas fronteiras da tecnologia.
O professor de História da América José Alves de Freitas Neto, da Unicamp, acrescenta a esse caldo de insatisfação a sensação (real ou não) de interrupção da mobilidade que trouxe o repertório da exclusão com toda intensidade. “E tem a impotência dos governos diante de uma ordem econômica que não conseguem manejar”, diz ele, ao blog.