Entenda as suspeitas contra Juscelino Filho, que pode ser o primeiro ministro a deixar o governo Lula

De ocultação de patrimĂŽnio ao uso de orçamento secreto para beneficiar uma propriedade da famĂ­lia, Juscelino Filho (UniĂŁo-MA), ministro das ComunicaçÔes, estĂĄ enfrentando diversas denĂșncias do presente e do passado desde que foi nomeado pelo presidente Lula ao cargo. Em meio Ă s polĂȘmicas, o petista chegou a afirmar, nesta quinta-feira, que deve se reunir com o ministro na prĂłxima semana, e que o parlamentar terĂĄ que deixar o posto caso nĂŁo prove sua inocĂȘncia. JĂĄ a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, defendeu o afastamento do ministro como medida para impedir "o constrangimento de parte a parte".

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AtĂ© o Ășltimo ano, Juscelino era um deputado federal nĂŁo muito conhecido. Desde janeiro, o mĂ©dico radiologista foi incluĂ­do pelo presidente na sua equipe, a partir de uma costura liderada pelo senador Davi Alcolumbre (UniĂŁo-AP), responsĂĄvel pela indicação do partido para a pasta. Sem experiĂȘncias anteriores em Comunicação, o ministro Ă© alvo de diferentes acusaçÔes, o que levou Lula a nĂŁo garantir sua permanĂȘncia na pasta:

— Se ele nĂŁo conseguir provar a inocĂȘncia, ele nĂŁo pode ficar no governo — afirmou Lula em entrevista ao jornalista Reinaldo Azevedo, transmitida pelo Grupo Bandeirantes. O presidente informou ainda que solicitou a Rui Costa, ministro-chefe da Casa Civil, que marcasse uma reuniĂŁo com o ministro das ComunicaçÔes. O encontro entre o presidente o ministro acusado estĂĄ com data marcada para a prĂłxima segunda-feira, dia 6, quando Juscelino retornar de uma viagem ao exterior.

Veja, ponto a ponto, todas as questÔes envolvendo Juscelino Filho.

Uso de AviĂŁo da FAB

Juscelino Filho utilizou um avião da Força Aérea Brasília (FAB) para viajar de Brasília para São Paulo, onde participou de uma série de eventos relativos ao mercado de cavalos, tema do qual é negociante e entusiasta. Em solo paulista, ao longo do fim de semana no fim de janeiro, o titular da pasta manteve apenas duas horas e meia de agendas oficiais. Ao solicitar o voo, Juscelino classificou a viagem como "urgente". As informaçÔes são do jornal Estado de S. Paulo.

Apaixonado por cavalos, o deputado assessorou compradores de animais e recebeu o "Oscar" dos criadores no fim de semana da viagem. AlĂ©m disso, inaugurou uma praça em homenagem a um cavalo de seu sĂłcio e promoveu um dos seus animais de criação. Em 2022, o Ășnico projeto apresentado por ele na CĂąmara foi relativo ao dia nacional do animal.

Em defesa, o ministro alegou que devolveu as diårias recebidas logo após a reportagem ter sido publicada. O ministério o defendeu dizendo que não haviam irregularidades e que seria "inaceitåvel aventar qualquer pråtica ilegal", jå que Juscelino estaria em seu "período de folga".

Orçamento secreto

Para asfaltar uma estrada de terra que passa em frente a oito fazendas de sua família, em Vitorino Freire (MA), o ministro direcionou R$ 5 milhÔes do orçamento secreto. A informação foi divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo. O asfaltamento se deu ainda numa cidade onde a irmã dele, Luanna Rezende, é prefeita.

AlĂ©m do trecho que passa em frente Ă s fazendas da famĂ­lia do ministro, que custou R$ 5 milhĂ”es, a obra para asfaltar a estrada teve um total orçado em R$ 7,5 milhĂ”es. O restante atendeu a 11 ruas de povoados do municĂ­pio. A justificativa de Juscelino foi que as fazendas beneficiadas pela estrada sĂŁo cercadas por "inĂșmeros povoados".

PatrimĂŽnio oculto

O ministro não informou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um patrimÎnio de ao menos R$ 2,2 milhÔes em cavalos de raça. As declaraçÔes de bens foram entregues em 2022, quando registrou a candidatura a deputado federal, também segundo o Estadão.

O patrimÎnio informado por Juscelino foi de R$ 4,457 milhÔes em sua declaração ao TSE, valor semelhante aos R$ 4,426 milhÔes movimentados por ele em leilÔes desde 2018.

A acusação também envolve cavalos que são criados num haras em Vitorino Freire. Na documentação, a propriedade é da irmã do ministro e do Gustavo Marques Gaspar, um ex-assessor dele na Cùmara. Mas, nos leilÔes, ele é nomeado pelos organizadores como o dono das terras.

Dados falsos

O ministro informou à Justiça Eleitoral que transportou cabos eleitorais em viagens durante a campanha para deputado, no entanto, o que consta na documentação são nomes de uma família de São Paulo que alega não conhecer Juscelino. De acordo com o Estadão, a lista falsa de passageiros foi usada para prestar contas de R$ 385 mil em gastos de Fundo Eleitoral com sua campanha.. O pai da família que consta na planilha afirmou que foi uma "fraude."

Juscelino Filho negou as acusaçÔes e destacou, em nota, que "todos os voos foram feitos em prol da campanha eleitoral, bem como todas as pessoas que constam nos relatórios prestaram serviços diretamente à campanha".

Contrato com empresa suspeita

O ministro das ComunicaçÔes teria contratado a consultoria de uma ex-diretora do Tribunal de Justiça do Maranhão condenada por fraudar a folha de pagamento da Corte. De acordo com colunista Guilherme Amado, do portal Metrópoles, a Sapere Consultoria LTDA, que pertence a Maria Bernadete Carmo Lima, recebeu R$ 73.800 para fazer panfletagem, bandeiragem e carreatas na campanha à reeleição do deputado.

Ainda segundo a reportagem, o ministro chegou a ir pessoalmente na SuperintendĂȘncia da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do SĂŁo Francisco e do ParnaĂ­ba (Codevasf), no MaranhĂŁo, para defender a permanĂȘncia da concorrĂȘncia.

PressĂŁo polĂ­tica

AlĂ©m de todas as suspeitas relativas a supostas irregularidades, Juscelino Filho tambĂ©m se vĂȘ em meio a uma disputa polĂ­tica. Seu partido, o UniĂŁo Brasil, escolheu trĂȘs ministros de Lula, o maior nĂșmero atrĂĄs apenas do prĂłprio PT (MDB e PSD tambĂ©m contam com trĂȘs titulares de pasta cada). O espaço dado para siglas do CentrĂŁo contrariou alguns setores petistas, simbolizados pela presidente Gleisi Hoffmann — que, agora, defende a saĂ­da de Juscelino.

Nesta sexta-feira, o ministro de RelaçÔes Institucionais, Alexandre Padilha, também do PT, saiu em defesa do responsåvel pelas ComunicaçÔes. Ele endossou a posição do próprio Lula, que solicitou a Padilha a conversa com Juscelino a ser realizada na próxima segunda-feira.

— Como disse o presidente Lula, todos os ministros e ministras, independentemente do partido, tĂȘm direito a presunção de inocĂȘncia. O que se espera de todos eles Ă© que tenha espaço para sua defesa. E tenho certeza que o farĂŁo, sem prejulgamentos. JĂĄ vi muita gente ser afastada por prejulgamentos injustos, inclusive companheiros do PT — disse Padilha ao GLOBO.

*EstagiĂĄria sob supervisĂŁo de Cibelle Brito.