Procura-se jabutis-tinga: projeto pede ajuda de visitantes do Parque da Tijuca para localizar desaparecidos
O Parque Nacional da Tijuca estĂĄ perdendo lentamente, mas sem parar, o status de floresta vazia. E a ONG Refauna, fundada em 2010, nĂŁo poupa esforços para fazer isso acontecer. PorĂ©m, no processo de monitoramento dos animais reinseridos na ĂĄrea, um problema apareceu no caminho dos pesquisadores: o desaparecimento de oito jabutis-tinga entre os 27 que ainda estĂŁo sob acompanhamento â em 2020, 50 animais foram soltos; eles fazem parte das quatro espĂ©cies reintegrada pelo projeto no territĂłrio de mais de 39 milhĂ”es de kmÂČ.
O pesquisador Thales Querino de Souza, biólogo formado pela UFRJ e coordenador da reintrodução de jabutis-tinga na Floresta da Tijuca, conta que durante o acompanhamento mensal feito pela equipe foi notado o sumiço. Eles são rastreados através de radiotransmissores, que são colados nos cascos e podem ter sido perdidos ou sofrido algum tipo de dano.
â Esses aparelhos costumam durar de 2 a 3 anos. NĂłs precisamos dessas informaçÔes para termos respostas sobre a reintrodução, se eles estĂŁo acasalando, copulando e tendo filhotes. Alguns dos jabutis estĂŁo desaparecidos; nĂŁo temos como ter certeza se os rĂĄdios caĂram ou se nĂŁo funcionam mais â explica Thales.
Mesmo sendo reconhecidos e catalogados como parte do grupo reintroduzido, existe uma dificuldade fĂsica em localizar os animais sem rĂĄdio, por conta da caracterĂstica natural da espĂ©cie de se deslocar por grandes distĂąncias. Por isso, o Refauna decidiu incluir os "trilheiros" e os visitantes nas buscas. AtravĂ©s das suas pĂĄginas nas redes sociais, a comunidade ao redor do Parque Ă© incentivada a ajudar.
"Precisamos de atenção redobrada de quem anda aqui no Parque e de disposição para nos ajudar numa missão muito importante, que é encontrar nossos amigos!", orienta o post.
O passo a passo para poder contribuir Ă©: registrar em fotos e vĂdeos, depois contactar equipes locais e tambĂ©m a ONG sobre qual o jabuti avistado. Para facilitar o reconhecimento, tambĂ©m foram divulgados os nĂșmeros registrados no casco, junto de fotos dos animais. Neste mĂȘs, a contribuição deu resultado. Hermes, de nĂșmero 64, foi avistado a 2 km do ponto de onde foi solto. PorĂ©m, quando a equipe o localizou, jĂĄ era tarde demais.
â O nosso 64, chamado Hermes, foi visto por visitantes e fomos atrĂĄs dele. Ele foi um exemplo de esforço da comunidade que deu certo. Apesar da gente nĂŁo ter visto quando procuramos, muita gente viu e tirou foto. Depois de um tempo, encontramos ele morto. Agora ele estĂĄ em necrĂłpsia para sabermos se essa morte poderia ter sido evitada â conta o biĂłlogo.
Uma das suspeitas da morte de Hermes Ă© ataque de cachorro. Segundo Thales, muitos cruzam a fronteira da floresta pelos bairros vizinhos, outros acabam encontrando refĂșgio na mata fechada. No entanto, podem acontecer acidentes quando um animal de menor porte cruza o caminho dos cĂŁes.
â Temos um problema no Parque de ataque de cachorro. Ele foi encontrado com ferimento nas patas, que geralmente Ă© relacionado a esse tipo de ataque. Ele mostrou para a gente que o envolvimento das pessoas nessa causa Ă© bom. Graças a isso conseguimos uma resposta, descobrimos o estado desse bicho â relata o coordenador da reintrodução dos jabutis-tinga.
Dentre o grupo que continua na lista de procurados estĂŁo: Mirabel (03), Grizzy (07), VĂȘnus (15), Cristal (28), Bilbo (26), nĂșmero 27 e nĂșmero 23.
A ONG tambĂ©m enfrenta outro problema na tarefa de monitoramento das espĂ©cies reintroduzidas na floresta: o financeiro. Afinal, cada rĂĄdio custa R$ 1 mil. AtĂ© agora, com o financiamento de apoiadores, quatro foram comprados, nĂșmero menor do que o necessĂĄrio para todos os indivĂduos.
Segundo o pesquisador, esses rĂ©pteis tĂȘm uma expectativa de vida maior que 80 anos, mas o acompanhamento deles nĂŁo serĂĄ por toda a vida. O crucial Ă© os pesquisadores conseguirem compreender os resultados e impactos da presença deles no Parque.
â Para manter a conservação, nĂłs precisamos saber se eles estĂŁo acasalando, copulando e tendo filhotes. Por isso, por enquanto, precisamos manter o monitoramento constante â esclarece.
A importĂąncia do projeto, que tambĂ©m Ă© responsĂĄvel pela presença de cutias-vermelhas, bugios e antas, todas reintegradas, estĂĄ na conservação da vida de toda a Floresta da Tijuca. Todos eles participam na dispersĂŁo de sementes grandes, que geram novas ĂĄrvores, gerando um equilĂbrio.
â Hoje, com açÔes como as do Refauna, que buscam resgatar a interação ecolĂłgica, temos resultados muito bons da recuperação da nossa fauna nativa â pontua Eduardo Frederico, chefe do Parque Nacional da Tijuca.