Em meio a protestos pela descriminalização da maconha, Toffoli retira julgamento de pauta no STF

Por Caroline Oliveira
Em meio a manifestações a favor da descriminalização da maconha por cidades do Brasil, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli decidiu retirar de pauta o julgamento sobre a descriminalização de drogas. A medida foi anunciada dois dias após Toffoli se encontrar com o presidente Jair Bolsonaro e com os presidentes do Congresso Nacional Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre para negociar um pacto a favor das reformas econômicas.
O plenário do STF votaria na próxima quarta-feira, 5 de junho, novamente a criminalização de drogas. Depois da decisão do presidente da Casa, segue sem nova data definida.
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A ação entrou em votação pela primeira vez em 2015 e é decorrente de um recurso extraordinário (nº 635.659) apresentado, em 2011, pela Defensoria Pública de São Paulo, para que o STF reconheça a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas. Até o momento, três ministros votaram a ação. Gilmar Mendes mostrou-se favorável ao recurso e a punições administrativas ao usuários de drogas ilícitas, e não penais como é hoje. Luís Roberto Barroso também se mostrou favorável. No entanto, entende que a descriminalização deve ser gradual e começando pela maconha. Edson Fachin seguiu o mesmo caminho e se posicionou para manter a proibição do porte e uso de drogas ilícitas com exceção da maconha. Em seguida, pediu vistas.
De acordo com a legislação acima, “quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido” a penas. Se o STF decidir que o artigo é improcedente, descriminalizará o uso de substâncias consideradas ilícitas.
No mesmo dia, a Federação Amor Exigente (FEAE), ligada a comunidades terapêuticas, protocolou uma petição no STF pelo adiamento do julgamento até que o Projeto de Lei da Câmara 37 (PLC 37), aprovado pelo Senado, seja sancionado pelo presidente. O PL modifica a Lei de Drogas e prevê, por exemplo, a possibilidade de internação voluntária, ou seja, sem o consentimento do dependente químico. Coincidentemente, Bolsonaro tem até o dia 5 de junho para sancioná-lo.
O PL é de autoria do então deputado Osmar Terra, hoje ministro da Cidadania. Ao lado do ministro de Justiça e Segurança Pública, Terra é um dos responsáveis pela implementação da nova Política Nacional de Drogas (Pnad), decretada pelo presidente. Em entrevista recente ao jornal O Globo, o ministro afirmou que hoje há no país uma epidemia de crack.
No entanto, de acordo com o 3º Levantamento Nacional sobre o Uso de Drogas pela População Brasileira, encomendado pelo Ministério da Justiça, em 2014, à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o crack foi consumido por 0,9% da população uma vez na vida; 0,3% no último ano; e 0,1% nos últimos 30 dias. Ao contrário do álcool: 66,4% já consumiram álcool na vida; 43,1% no último ano; e 30,1% nos últimos 30 dias. Sobre a pesquisa, Terra firmou que a Fiocruz possui um “viés ideológico”.
Atualmente, o porte de entorpecentes é tipificado como um crime. No entanto, pela lei, os usuários não podem ser punidos com prisão. Ainda assim, o critério para diferenciar um usuário de um traficante fica a cargo da polícia.
Segundo dados do Ministério da Justiça, após a aprovação da Lei de Drogas, entre 2006 e 2017, houve um aumento de mais de 80% da população carcerária, batendo 727 mil pessoas. Em 2016, 200 mil encarcerados somente pela Lei de Drogas.
De acordo com Cristiano Maronna, secretário-executivo da Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD), “a política de drogas representa um retrocesso. O Brasil é um dos únicos países que ainda criminaliza o uso de drogas. Praticamente, todos os nossos vizinhos já avançaram nisso. Uruguai já regulamentou a produção e distribuição e comércio de cannabis. O México está indo no mesmo caminho em relação a todas as drogas. Estados Unidos têm mais de 30 estados com maconha disponível para fins terapêuticos e adultos. Canadá, Portugal, Espanha, República Tcheca, Israel, Itália, Áustria… Enfim, muitos países estão experimentando novas abordagens. Nós estamos ficando pra trás, ao lado das Filipinas, Tailândia, Irã…”.